Entre lugares – Diálogo com a arte e as memórias de Galeno
Entrevista Concedida á Luciany Osório
Quando cheguei a Brazlândia e as pessoas ficavam sabendo que eu trabalhava com arte, logo me perguntavam se conhecia o Galeno. A pergunta vinha sempre carregada com um misto de admiração e orgulho do personagem ilustre da cidade. Oito anos depois, ainda é fácil reconhecer que o artista habita o imaginário dos moradores da cidade que o recebeu ainda criança.
Francisco Galeno saiu do Piauí aos oito anos, acompanhado da mãe e dos irmãos para se encontrar com o pai, que viera antes trabalhar nas obras da nova capital. Foi morando em um acampamento, junto com a família às margens do Lago Paranoá, que começou a descobrir através das brincadeiras de criança esse novo espaço. A mudança para Brazlândia se deu quatro anos mais tarde e foi aqui que ele passou toda a adolescência e vida adulta. Para Galeno essa nova fase foi como uma aventura de menino, uma oportunidade para explorar este novo lugar.
De uma família repleta de artesãos habilidosos, cujo bisavô fazia canoas, o avô fazia selas e a mãe rendeira, Galeno se recorda que o que lhe interessava durante a infância eram os carreteis descartados pela mãe e que lhe serviam para a construção de brinquedos. Cresceu vendo Batista, o irmão mais velho, se desenvolver como artista produzindo suas esculturas.
Ao rememorar os tempos alegres da infância, Galeno ressalta a importância destas memórias e destes espaços onde viveu para a sua obra. Para o artista tanto as vivência da primeira infância no Piauí quanto sua trajetória no Distrito Federal foram de suma importância para a construção poética das suas obras.
“Se tivesse que viver de novo com certeza viveria coisas que não deu tempo ou coisas que eu esqueci de fazer”.
Na juventude flertou com a música e com o teatro até se encontrar nas artes plásticas. Iniciou sua carreira artística como pintor de paisagens, mas logo percebeu que precisava encontrar sua própria identidade e estilo como artista. Foi no contato com importantes nomes das artes plásticas, como Siron Franco, Antônio Poteiro, Athos Bulcão, Quinca, Rubens Valentin, entre outros, que Galeno se descobriu dentro do movimento construtivista da arte brasileira.
“Eu passei a entender a partir do momento que eu estava ali dentro”.
Dono de obras vibrantes construídas por pedaços de memórias, a arte de Galeno dialoga com a cultura popular brasileira ao mesmo tempo em que se assume moderna. Entre pinturas, esculturas e objetos que exploram diferentes materiais como ferro e madeira é possível identificar em suas produções trechos da sua história.
Tendo participado de diversas exposições coletivas e individuais em várias partes do Brasil, Alemanha, França e Suécia, o artista lembra de momentos em que expôs suas obras no Santuário Menino Jesus e na Biblioteca Érico Veríssimo em Brazlândia e ressalta que assim como hoje, a cidade não tinha espaços dedicados a arte e que desta forma teve que improvisar locais para que sua obra fosse também apresentada para os moradores da cidade.
Hoje, Galeno se divide entre seus dois ateliês, um em Brazlândia e o outro na Parnaíba, e se alegra pelo fato de estar sempre em casa, ou aqui ou lá. Perguntado sobre a fase que está vivendo como artista, Galeno celebra a relevância da maturidade em sua obra.
“É um período em que você está pronto para desenvolver coisas melhores. Dizem que o artista é como o vinho, quanto mais velho melhor”.
O artista foi homenageado pelo escritor Daniel Porto Poeta com um poema em seu livro Poesias do Porto – A mulher, o poeta e a cidade (2013). Galeno retribuiu a homenagem com a obra que ilustra a capa do livro. Esses encontros com a cidade e outros artistas locais intensificam ainda mais os laços de Galeno com essa terra.
UM PEDACINHO DE BRASÍLIA NOS OLHOS DE GALENO
(Autor Daniel Porto Poeta)
Brazlândia
Tu és para mim a única
singela
bela
acolhedora
canteiros de alma
com muitas flores
de um aroma fraternal
laço que nos une
trilhas verdes
cachoeiras
água em abundância
para quem tem sede.
Tu és para mim a única
e a cestinha de morango
nos olhos rasgadinhos
da menina conta sua vida