Desde sua chegada ao Brasil em 2014, a Uber transformou o cotidiano, assim como a novela “Avenida Brasil” ou a popularização dos smartphones com telas sensíveis ao toque. Coincidentemente com a dolorosa derrota do 7×1 na Copa do Mundo, a chegada da Uber abalou a categoria dos taxistas. A possibilidade de saber o custo da corrida antecipadamente cativou a população, que antes lidava com valores incertos e, muitas vezes, mais altos do que o esperado nas corridas de táxi. Essa mudança tecnológica e de comportamento moldou os últimos 20 anos, impactando até mesmo a natureza de golpes como sequestros-relâmpago e trotes de presídios.
É provável que você já tenha utilizado a Uber. Se for um usuário frequente, certamente tem histórias para contar. Eu mesmo, embora não seja um usuário assíduo, utilizo o serviço cerca de quatro vezes por mês. Na minha cidade, há até a opção de Uber Moto, que, apesar de mais perigosa, oferece uma experiência, digamos, peculiar.
Certa vez, peguei um Uber onde o motorista filmava a corrida, informando sobre isso logo no início. Ele explicou que começou a gravar após uma situação em que uma passageira, ao desembarcar e encontrar seu ex e atual namorados, tentou envolvê-lo em um drama amoroso. Ao descer do carro ela gritou para o motorista:
“Olha, amor! Não é nada disso que você está pensando, eu amo você, não me deixa!” O motorista quase foi agredido, mas antes que acontecesse, entendeu nas entrelinhas que a corrida já havia sido paga e que ela terminaria o espetáculo sozinha.
Em uma corrida de Uber Moto, o motociclista pediu para pararmos para ele ir ao banheiro. A demora foi tanta que parecia que ele estava “adubando o vaso”. Esperei, ele retornou e agradeceu. Meses depois, ele me convidou para um churrasco em sua garagem nova, e nos tornamos amigos. Foi ele, o Francisco, quem me ensinou a pilotar moto. Um grande abraço a ele!
O último motorista de Uber com quem tive uma corrida era um entusiasta do piseiro, tocando desde MPB até reggae nesse estilo. De óculos escuros, ele cantava Roberto Carlos e Titãs, com a cabeça para fora do carro, como se fosse o passageiro. Em dado momento, começou a tocar músicas com letras explicitamente pornográficas e ele cantava todas. Ao passar em frente a uma igreja católica, fez o sinal da cruz, demonstrando uma curiosa mistura de hábitos.
Adoro conversar e os motoristas de Uber são bastante diversos. Diferente dos taxistas, alguns são calados, outros, mesmo calados, são mal-educados. Há também os muito comunicativos e os empáticos. A categoria não possui um perfil único, pois é um refúgio para quem busca trabalho, não uma vocação. Apesar do capitalismo prometer liberdade financeira, ninguém deveria precisar trabalhar de 10 a 15 horas por dia para ter uma vida digna. A verdade é que os aplicativos de transportes de modo geral salvam-nos em muitas emergências. A caminho de uma festa, uma vez comprei um perfume dentro do Uber, isso foi o máximo que já dei em forma de elogio (dinheiro extra).
Fui!
Thiago Maroca é escritor, pai e chefe escoteiro. Anda de Uber quando perde o ônibus.
Manda um oi: Thiagomaroca@gmail.com / @thiagomaroca



