O perigo em ser uma “BOA PESSOA” (a síndrome do salvador)
Por Marco Sousa
Quem não conhece pessoas que procuram ser úteis, prestativas, atenciosas, preocupando-se sempre pelos interesses dos outros, ajudando quem necessita, colocando os seus interesses acima dos seus e, quando não correspondida, transforma-se em outra pessoa? Em suma, alguém que se identifica com esta síndrome procura ser uma boa pessoa, sendo refém dessa imagem que quer transmitir aos outros.
Por sua vez, um salvador procura sempre náufragos emocionais para validar a sua necessidade em querer salvar. Uma “boa pessoa” necessita de vítimas para sentir-se válida e quando não encontra, acredita que perde a sua utilidade e cai num abismo emocional. Com isso, observa-se com frequência um salvador rodeado por relacionamentos tóxicos.
Alguém que assume que tem por missão querer ajudar e salvar o mundo (anulando-se a si mesma), nada mais está na necessidade emocional em querer agradar o outro e, com isso recebe em troca ingredientes emocionais vitais que lhe estão em carência como valor, reconhecimento, amor, atenção, etc. “A melhor forma de salvar o mundo é ser você mesma”, já dizia uma mestre de 82 anos que se confrontou com este “mal” existencial.
Quando opta por pensar em si mesma, sente que o mundo a traiu e, que tudo que faz na sua boa intenção é perdido e não recebe o que merece. Uma profunda angústia é consciencializada que, nada mais, é o destapar de feridas emocionais vindas da infância, onde para sobreviver, teve que sacrificar as suas necessidades em nome do bem-estar da família. Por outras palavras, esta síndrome é o resultado de uma infância emocionalmente carente na qual requer um regresso à criança que foi e salvá-la da dor que teve que reprimir.
A síndrome acaba por ser uma estratégia de sobrevivência onde o auto sacrifício passa a ser o modo de relacionar-se com os outros, obrigando-a a esconder os seus verdadeiros anseios. “Eu ando a ajudar todo mundo e, no fundo, acabo por apanhar com tudo em cima de mim”; “Eu sou boa pessoa, ajudo toda a gente e a vida tem sido ingrata comigo”; “Como é possível a minha vida não andar para a frente se eu faço tudo pelas pessoas que estão a minha volta?” Dilemas deste conteúdo fazem parte da realidade psicológica de alguém que traz consigo uma criança que sentiu que não foi ouvida, reconhecida, apoiada, vista ou amada, consequências de pais emocionalmente ausentes, desconectados ou perturbados.
A solução
O segredo para encontrar a saída desta estratégia bem montada é comprometer-se em cuidar de si mesma, realizando um processo de autoconhecimento e conjunto com terapia que a leve aos lugares “vazios” do passado de uma forma empática, segura e respeitosa. Não vale a pena lutar contra algo que salvou a sua vida nos primeiros anos de existência, pois a criança de outrora não tinha as competências que o adulto de hoje tem. Nessa descoberta, relacionamentos irão se perder, dando lugar a um sentimento de tristeza, mágoa ou luto.
Saiba que para dar lugar ao novo, primeiro é necessário soltar o velho. Um período de “solidão” pode ser necessário. O processo de conciliação psicológica com esta síndrome requer tempo, respeito e integridade. Os ganhos são incalculáveis, pois é só no lugar de amor-próprio e dignidade que pode fazer verdadeiramente diferença na vida de alguém, recuperando sonhos que estavam em standby no peitoril da janela, prontos para ser abraçados. “Mais vale ser uma pessoa completa do que ser uma boa pessoa.” Carl G. Jung.