Presente mas ausente

Hoje mandei uma mensagem qualquer para um amigo de longa data, piada de time, coisa de homem besta com espírito de quinta série. A continuação da conversa sempre caminha para as pazes porque o futebol não merece acabar com a nossa amizade. O assunto continua sobre os questionamentos da programação da vida adulta: esposa, filhos e trabalho. Casamento com aquelas dificuldades que todos passam, mas bem, viver a dois é aprender a ceder, isso é amor também. Os filhos, como sempre, motivo de orgulho, apesar das dificuldades da criação, nada que fuja da normalidade, um pouco de preguiça, moda esquisita e alguns vacilos na escola, mas sempre passando de ano, o prêmio é comemorar viajando para a praia depois do ano novo. No trabalho, o de sempre, às vezes sobrecarregado, às vezes sem novidades e em algum momento sempre vem o questionamento sobre mudar de profissão.
“Mas e aí? E no mais?”
“No mais, tudo bem. E por aí? Sabe quem eu vejo direto? Aquela menina que sentava no fundão, tem um comércio, loja de roupas, casada e com duas filhas, a mais nova faz natação com o meu caçula.”
“Nunca mais vi ninguém daquela época.”
Foi aí que me liguei. Eu e meu grande amigo não nos vemos pessoalmente há mais de uma década. Como isso aconteceu? Durante a idade escolar, passávamos a tarde juntos, fazíamos trabalho, tocávamos violão e jogávamos bola. Quando foi que nós distanciamos? As escolhas da vida nos colocaram em lugares diferentes e distantes. As redes sociais nos mantêm notificados, mas não presente. O tempo levou-nos para longe e faz mais de uma década.
Talvez seja ingenuidade minha, achar que ainda podemos nos considerar amigos, podemos reclassificar a amizade para um “colegas”, temos boas lembranças durante uma fase da vida, mas, no fundo, não sabemos nada da vida adulta um do outro. Não sei se ele ainda desenha, se isso evoluiu para uma profissão, até onde sei ele virou contador. Também não sei que tipo de passatempo pratica nas horas de folga, se é viciado em carro antigo, se gosta de cerveja artesanal.
Ele também não sabe que eu gosto de ouvir as toadas de Parintins(amo os dois bois), que peguei gosto em fazer os pequenos reparos na casa e todo mês eu compro uma ferramenta nova onde terei um espaço para todas elas na chácara que um dia comprarei.
Permanecem na memória as lembranças nostálgicas da juventude, dos momentos simples, das boas conversas e das muitas risadas. Recordo também os mil planos para o futuro incerto, a insegurança pré-vestibular e o receio do porvir após o ensino médio. Saber o que deseja para sua vida é ótimo, mas ter dúvidas também é um caminho. Eu lembro que a gente falava que sempre iríamos ser vizinhos, ao menos morar na mesma cidade, mas não foi isso que o destino nos proporcionou. Ele se foi e eu continuei aqui, estou feliz com as minhas escolhas e acredito que ele também.
Tomara que não demore mais dez anos para eu notar que faz tempo que não nos abraçamos.

Thiago Maroca é um escritor que às vezes divaga sobre o tempo. Membro da Academia Valparaisense de Letras, produtor audiovisual, mestre em educação, escoteiro e pai do Théo
Manda um OI:@thiagomaroca/thiagomaroca@gmail.com

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