As competência socioemocionais em tempos de crise e conflito

“Não diga que a vitória está perdida se é de batalhas que se vive a vida.” 

Este era o pensamento de Raul Seixas, cada dia é um dia de batalha. Apenas para ficar de repouso o corpo humano gasta até 80watts, ou em atividade física chega até a 400w, para se ter uma ideia de comparação uma lâmpada de led que você tem na sua casa gasta 9w, um celular consume por carga 15watts. 

Bom, é complicado estar de pé, foram necessários muitos séculos de evolução para apenas nos levantarmos da cama ao acordar. E mesmo depois de tanta luta, de séculos de aprendizado, ainda não estamos em paz.

A paz, segundo Hermann Hesse, é um ideal. Não existiria a paz na condição humana, ela é uma fantasia. O estado natural é o estado de vigília. Por outro lado, Gandhi dizia que: não existe um caminho para a paz. A paz é o caminho. Entre Guerra e Paz estamos sempre em busca de equilíbrio, seja para nos mantermos de pé, seja para estabelecermos conexões sociais. As competências para tempos de crise são fundamentais, já que a história é a soma das ações e decisões dos homens comuns, como acentua Tolstói.

Em tempos de crise as competências socioemocionais se tornam ainda mais cruciais para a sobrevivência, bem-estar e capacidade de reconstrução de indivíduos e comunidades. Cenários de instabilidade, medo, perdas e incertezas exigem habilidades que vão além do conhecimento técnico ou cognitivo.

Crises e guerras geram altos níveis de estresse, ansiedade, medo e trauma.

Competências como a tolerância ao estresse, a autorregulação emocional e a resiliência permitem que as pessoas administrem seus sentimentos, reconheçam a frustração e evitem agir de forma impulsiva, buscando uma perspectiva mais propositiva.

A saúde mental é severamente impactada por esses eventos. Competências socioemocionais como o autoconhecimento e a capacidade de perceber e lidar com as próprias emoções são fundamentais para a promoção do bem-estar psicológico e a prevenção de transtornos.

O desenvolvimento das competências socioemocionais não é inato; ele pode ser cultivado ao longo da vida e, em contextos de crise, pode ser acelerado. 

Programas e atividades em escolas e comunidades que ensinam explicitamente essas habilidades podem ser fundamentais para passarmos por períodos de crise e instabilidade social. 

Alguns paradigmas podem ser utilizados se pensarmos em estruturas práticas para compreensão das competências socioemocionais, entre eles o modelo do framework do CASEL (Collaborative for Academic, Social, and Emotional Learning). 

O CASEL é uma organização, fundado em 1994, em Chicago, EUA, que promove um programa de aprendizagem socioemocional (SEL), identificando cinco competências centrais que são precisamente as que se tornam críticas em cenários de adversidade extrema. Atualmente um dos modelos adotados pela BNCC (Base Nacional do Currículo Comum) da educação básica do Brasil.

As 5 Competências Centrais do CASEL são: Autoconsciência (Self-Awareness); Autogestão (Self-Management); Consciência Social (Social Awareness); Habilidades de Relacionamento (Relationship Skills) e Tomada de Decisão Responsável (Responsible Decision-Making).

Em geral, pressupõe a capacidade de compreender as próprias emoções, pensamentos e valores e como eles influenciam o comportamento em diferentes contextos. Inclui ter uma percepção precisa de suas forças e limitações, com um senso de confiança, otimismo e mentalidade de crescimento.

A capacidade de regular as próprias emoções, pensamentos e comportamentos de forma eficaz em diferentes situações, gerenciando o estresse, controlando impulsos e motivando-se para atingir objetivos pessoais e coletivos.

Tomar a perspectiva dos outros e sentir empatia por eles, incluindo aqueles de diversas origens e culturas. Envolve compreender as normas sociais e éticas de comportamento e reconhecer os recursos e apoios da família, escola e comunidade. A consciência social também permite identificar quem precisa de ajuda e onde estão os recursos disponíveis na comunidade.

Estabelecer e manter relacionamentos saudáveis e gratificantes com indivíduos e grupos diversos. Inclui a capacidade de se comunicar claramente, ouvir ativamente, cooperar, negociar conflitos de forma construtiva e buscar ou oferecer ajuda quando necessário. 

Em contextos de guerra, a resolução construtiva de conflitos (mesmo em pequena escala) pode prevenir a escalada de tensões entre pessoas sob pressão.

Também a capacidade de fazer escolhas construtivas sobre o comportamento pessoal e as interações sociais, com base em padrões éticos, preocupações de segurança e normas sociais apropriadas.

Ao abordar o desenvolvimento dessas cinco competências, estamos equipando indivíduos e comunidades com as ferramentas emocionais e sociais necessárias para o gerenciar o estresse, tomando decisões eficazes e buscando apoio, mantendo a esperança, a coesão social, capacidade de adaptação, colaborando, resolvendo problemas e planejando um futuro, mesmo que incerto.

Apesar das competências serem interconectadas, gostaria de ressaltar a questão da Autogestão para nossos leitores, diante do que já temos tratado aqui em artigos anteriores, de como os tempos atuais a condição da temporalidade tem sido tão desprivilegiada. 

O objetivo é regular as próprias emoções, pensamentos e comportamentos de forma eficaz. 

Podemos destacar nesta direção as técnicas de Controle do Estresse, tais como “Respiração Quadrada” (inspirar por 4, segurar por 4, expirar por 4, segurar por 4), muito importante em ataques de ansiedade. Definição de Metas SMART (Específicas, Mensuráveis, Atingíveis, Relevantes, Temporizáveis), também é dever de casa dos nossos leitores atentos.  Atividades físicas como caminhadas, ou outra da sua preferência. Também é importante técnicas de gestão do tempo, como a Pomodoro (Gestão do Tempo e Foco) e Mindfulness, ou atenção plena. Manter um diário das emoções também é uma dica valiosa.

Faça gerenciamento de conflitos internos através da Metacognição, por exemplo, pense em uma situação em que você tende a reagir de forma impulsiva (ex: irritação). Crie um “plano B” para essa reação: o que você pode fazer ou pensar de diferente da próxima vez? “Quando sentir raiva da demora, vou respirar fundo 5 vezes antes de falar.”

São exercícios básicos, mas que tenho certeza podem ajudar muito nossos leitores em tempo de crise e conflitos. Respira e não pira!

Sempre é tempo de desatar nós!!

Prof. Dr. William Figueiredo é filósofo, psicanalista, pós-doutor em Psicologia pela Universidade Federal de Uberlândia e doutor em Ciências da Religião. Especialista em Psicopatologia e Bem-Estar Social pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, atua com atendimento clínico online, supervisão e assessoria em desenvolvimento humano e educacional. Professor colaborador na Universidade Metodista de São Paulo e no Instituto Ânima, forma educadores em Educação Socioemocional. Ministra palestras, formações e workshops voltados à escuta qualificada, saúde mental e processos educativos.

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